Nome de filho. Como a gente escolhe? Parece que não tem ciência ou explicação racional, porque nem sempre há o acordo entre os pais. E quando há, nem sempre conseguimos entender o motivo de gostarmos de um e não de outro.

Mas a gente sempre escuta:

– Ih, não dá esse nome, não, porque é nome de criança capeta!

E quando a gente veta o nome no bebê porque é nome de ex-namorado? Acontece com todo mundo.

A afeição para com um nome depende de interpretação cognitiva. Vale para nome de filho, vale para nome de marca.

“-Mai qué qué isso?”

Interpretação cognitiva é o processo que nosso cérebro utiliza para organizar uma nova informação, colocando ela no seu devido lugar (mental e emocional). É como se você recebesse um estranho na sua casa. Você vai virar detetive e fazer várias perguntas antes de decidir se ele fica ou não. No fundo, o que seu cérebro quer é saber se essa nova informação tem valor.

Então, quando ouvimos um novo nome, de marca ou de bebê, usamos todo o nosso arsenal interpretativo, todas as referências que possam nos ajudar nessa investigação. Esse nome vale algo pra nós, ou não? Para conseguir bater o martelo, primeiramente usamos as referências linguísticas. Depois vêm as referências proeminentes de experiências coletivas, um espelhamento de valores ou histórias comuns. E logo, temos as referências individuais. 

Por que primeiro fazemos a ponte linguística? A linguagem humana, diferente da animal (a qual nós humanos também usamos), é parte primordial da nossa relação com o mundo. Trata-se de uma herança cultural que não está cravada nos nossos genes. Nós a criamos. Somos emissores e receptores de informações complexas que descrevem o que reside na nossa consciência face à realidade. E assim, através do exercício da linguagem, desenvolvemos um idioma, e nos sentimos integrados. A linguagem é a expressão máxima de uma cultura. Mais interessante que isso é poder constatar que, diferente de todos os outros animais que se restringem às linguagens de cada espécie, a convivência com outras sociedades é mais do que possível, pois somos capazes de falar e compreender a linguagem do outro. A domesticação de nosso instinto animal, ou seja, nossa vida coletiva pacífica é em grande parte possível graças à dominância do que falamos. 

Embora convenhamos, nem sempre a gente se entende. Mas estamos abertos a registrar linguagens diferentes. E é esse acervo o acionado quando uma nova palavra se apresenta.

-De onde você vem, queridão?” – seu cérebro pergunta.

Esse nome é do meu idioma materno, ou não? Se não é, vem de onde, de qual cultura? Por mais que não sejamos poliglotas, já ouvimos diversos outros idiomas e dialetos por aí. As chances se multiplicam com a Internet. Percebemos as palavras que tem um ar germânico, latino, anglo-saxão, asiático ou africano. Até mesmo um nome inventado como Google ou Pepsi, levam uma construção verbal e etimológica que te transportam para o lugar onde nasceram.

Quando não se tem isso em mente, há fortes chances de fracassar logo na largada. Max Gehringer sempre costuma mencionar em suas palestras o finado refrigerante ‘Josta‘. Vale refletir: Se esse nome tivesse sido criado no exterior, poderia ter vivido outra história?

“-Muito bem, quem é você?” – o cérebro persiste.

Ou seja, o que seu nome significa? Se o nome é auto ou semi descritivo, fica fácil. Por exemplo, General Motors. A gente já infere o universo e seleciona menos hipóteses para concluir do que se trata. Caso o nome não seja auto-descritivo, ou seja, mais neologista, vai precisar se explicar um pouco mais. Uma frase de efeito, um produto e, claro, a identidade visual precisam apontar na direção da ideia central para não gerar um telefone sem fio.

No caso da minha filha que se chama Ella, toda vez que digo seu nome no Brasil, rola o tilt. Tela azul, o sistema precisa ser reiniciado. O que me salva quando visitamos a terrinha é ter a chance de explicar nossa escolha para os que fazem cara de ““. Por esse motivo, um nome de marca que precisa ser muito explorado, pede mais investimento. O problema aumenta quando a empresa não dispõe de insumos para ficar gastando tempo explicando tudo.

Agora, vamos ver como esse nome cabe no seu mundo. 

Sua mente pergunta:

“-Quem te indicou a minha casa?”

Aqui você vai buscar referências por similitude ou espelhamento. Esse nome se parece com algo que você conhece? Há algum campo da sua vida em que lhe seja aderente? Alguma memória vem à tona? Por exemplo, Apple. A referência bíblica de algo que representa o desafio à ordem virá especialmente se você for ocidental, ainda que não religioso. Ou quem sabe você é mais fã da ciência, fazendo uma correlação com a maçã de Newton, que inspirou o labor de toda sua vida. Veja que falamos aqui de referências coletivas, que residem na mente da maior parte das pessoas.

A geração de sensações e emoções a partir destas pontes e interpretações é inevitável, e quanto mais investigamos, mais criamos uma ideia do todo, como que dando vestes a esta nova presença. É por isso que a escolha de um nome é uma arte que requer cautela. Cada nome de marca evoca uma resposta interna. Com base em referências colectivas, a interpretação geral pode não ser o que se esperaria, ou o que se precisa de trazer como estratégia.

Por isso, há nomes que carregam tradicionalismo ou vanguardismo. Há os que queiram inferir grandeza, um ar global. Outros que visam se conectar com uma pequena comunidade. O fato é que nome é cartão de visita, e já indica a que veio. Dificilmente Coco Chanel lhe dará uma sensação de marca futurista, ‘pra frentex’. Por outro lado, Issey Miyaki tem o poder de fazer o oposto. Cada uma destas marcas carrega uma pessoa, uma etimologia, uma história, valores de do país de origem, personalidade e ideais geracionais. Sem falar do posicionamento.

E assim, uma vez que este nome avança no processo cognitivo aportando valor a cada etapa investigativa, alcança uma sonhada etapa final. Nela, nossos desejos, únicos e individuais, querem saber se há alguma chance deste nome suprir o chamado, e finalmente preencher um espaço carente.

“- O hotel 6 Senses, consegue entender minhas necessidades? Sonho ter momentos de puro contemplamento, despertando-me para as sensações… quero conforto extremo para descansar a mente e espírito, quero ser tratado como realeza e ter a chance de estar em um lugar fora do comum.”

Bingo. Você pode até não verbalizar tudo isso de forma consciente, mas fique tranquilo. Sua mente sabe até do que você ainda não sabe.

Se um nome pode fazer essa conexão maravilhosa com o que sonhamos ser, ou como queremos ser vistos, ganhou lugar especial na nossa vida, a começar pelo nosso cérebro. Como quando a gente diz ‘bateu o santo’, ou quando falamos “A gente olhou um pro outro, sorriu e disse:É esse!‘.

Um detalhe: Veja como cada uma destas marcas de sucesso adicionam pistas visuais e entregas que condizem com o que verbalmente predicam através do nome.

O segredo de nome bem bolado é que ele é a porta de entrada, uma saudação engenhosa. Mas que obrigatoriamente necessita fazer sentido, gerar uma concatenação. Se não, Tilt.

Nome de marca bom não garante sucesso. Mas olha, abre uma boa vantagem. E igual nome de filho, terá mais chances de aceito se vir atrelado de nossas heranças culturais, se for capaz de fazer sentido, e se acender uma centelha no core do que queremos ser.

Ana Negreiros (a Nalu, no Brasil) é mamãe, empreendedora no setor de hotelaria e gastronomia, e fundadora da Branding Aurora